Consumidores devem ser beneficiados com a vitória de companhias de energia elétrica no julgamento da chamada “tese do século”, que trata da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Confins cobrado na conta de luz. Os processos das distribuidoras que atendem a população goiana já transitaram em julgado. No caso da Enel Goiás, a decisão ocorreu em março deste ano e a sentença envolve R$ 2,4 bilhões – valor que supera o preço pago pela empresa italiana para arrematar a antiga Celg Distribuição (R$ 2,187 bilhões).
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) realizou entre fevereiro e março deste ano uma consulta pública e estuda como fazer a devolução aos usuários do serviço. A proposta é de que isso ocorra por meio de abatimento nos próximos reajustes tarifários, em um prazo de até cinco anos. Mas as companhias reivindicam fatias do bolo. Por nota, o órgão informou à reportagem que o tema ainda está na fase de análise das contribuições recebidas.
No país, são mais de R$ 50,1 bilhões de créditos tributários que devem retornar aos consumidores, conforme cálculo da agência reguladora. O que só deve ocorrer porque, em 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a base de cálculo do PIS/Confins não poderia considerar o ICMS, que é tributo estadual, como parte do faturamento das empresas. Antes disso, várias distribuidoras tinham ações com esse questionamento na Justiça. O processo da antiga Celg D, que é assumida pela Enel, por exemplo, é de 2003.
Os principais beneficiados devem ser o Grupo Enel, Cemig e Light, que possuem os maiores créditos junto à União. Na semana passada, o STF definiu que as empresas que entraram na Justiça até março de 2017 têm direito a reaver valores pagos antes dessa data. Para a devolução, por lei, consideram-se cinco anos antes da propositura da ação. Até agosto de 2020, de 53 concessionárias de distribuição, 49 ingressaram em juízo contra a Fazenda Nacional.
Procurada pela reportagem, a Enel Goiás preferiu não se manifestar, mas informou por nota que sobre a forma de devolução aos usuários do serviço “acredita em decisão equilibrada do regulador”. Porém, em manifestação na consulta pública, o grupo defendeu que se ocorrer de forma difusa, para todos os consumidores, é preciso que a Aneel preveja mecanismos para impedir o retorno dos valores de forma duplicada. Isso porque há ao menos 43 processos de consumidores que pleiteiam a devolução individual.
“A devolução difusa, embora seja o meio de devolução mais viável na prática, traz um risco adicional”, pontua a empresa no texto encaminhado à Aneel. A defesa é de que ao fazer de forma individualizada a distribuidora não ficaria expostas ao risco de ter que devolver valores para os consumidores que arcaram “com as tarifas majoradas no passado mas que ou entendem que devem receber mais do que a cota-parte que lhes for alocada ou não são mais parte do mercado atual da distribuidora”.
Esse é o entendimento de várias distribuidoras, que pleiteiam a devolução pelo CPF ou CNPJ do consumidor, o que a agência reguladora considera ser uma via de difícil operacionalização. A companhia Hidroelétrica São Patrício (Chesp), que atua no Estado, faz parte do grupo que também reforça a defesa. A empresa contabiliza como valor da sentença R$ 6,7 milhões. O presidente da companhia, Ricardo de Pina Martin, acrescenta que há também pedido para retirar do montante despesas com advogados e com a parte operacional.
Com trânsito em julgado no final de 2019, a partir de 2020 os consumidores atendidos pela distribuidora tiveram o primeiro benefício. “Deixamos de incluir o ICMS no PIS/Confins desde janeiro do ano passado.” Ele acredita que na data de reajuste da tarifa, em novembro no caso da Chesp, o consumidor terá a compensação pelo passado. “Queremos devolver, mas por CNPJ e CPF, e queremos tirar despesas, pois fomos diligentes, fomos atrás de coisa que era injusta, imposto sobre imposto”.
DISTRIBUIDORA QUESTIONA DESCONTO EM TARIFA E PRAZO
A forma como os consumidores devem ser ressarcidos pelo valor pago a mais na conta de luz que considerava ICMS na base de cálculo do PIS/Confins ainda está em discussão pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O Grupo Enel, em consulta pública, manifestou preocupação com equilíbrio econômico-financeiro caso suas distribuidoras sejam obrigadas a repassar todo o critério tributário.
A empresa, que somente pela distribuidora em Goiás calcula receber R$ 2,4 bilhões, questiona o prazo para que essa devolução seja feita, que à princípio deve ocorrer a partir do reajuste anual deste ano – que ocorre em outubro para a antiga Celg D.
A defesa da multinacional é de que o processo não ocorra por meio de desconto na tarifa dos consumidores. Afirma em sua manifestação que isso implicaria em revisão completa do sistema operacional das distribuidoras, levaria tempo e seria possível aplicar a partir de 2022.
A sugestão é de que ocorra por meio de inclusão de componente financeiro nos processos tarifários, o que seria mais fácil de implantar. Além disso, quer garantia que o repasse dependa do efetivo aproveitamento do crédito tributário pelas distribuidoras, além de descontar custos relacionados, como aqueles com honorários advocatícios, que descreve como altos.
Advogado tributarista e representante da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB) no Conselho Administrativo Tributário (CAT), Simon Reimann explica que PIS/Confins é tributo devido pela concessionária e não pelo consumidor de energia, mas entra na tarifa porque é considerado para a formação de preço. Ele lembra que por regulação quando há alteração na cobrança de tributos para mais ou para menos é preciso que tenha alteração no preço cobrado ao usuário do serviço.
A compensação discutida ele explica que vem da redução da carga tributária para a empresa e tende a ser repassado o que for efetivamente aproveitado pela companhia. Assim, cálculos bilionários podem mudar e é preciso acompanhar o que efetivamente será considerado. É o que muitas empresas têm defendido. Distribuidoras querem que a devolução aos consumidores esteja sujeita ao tempo de compensação e às quantias do crédito tributário recebidas pelas companhias e na medida em que isso ocorrer.
Publicado por: Badiinho Filho/Com informações do Jornal O Popular