Escrito por: Janda Nayara (O popular)
“Funcionária de loja aplicou produto com a intenção de corrigir imperfeições nos glúteos”
Menos de 20 dias depois da morte de Maria José Medrado, de 39 anos, após a aplicação de uma substância para aumentar os glúteos, supostamente o hidrogel, outra mulher de Goiânia foi internada devido a complicações depois de procedimentos estéticos na busca pelo corpo perfeito. A funcionária de uma loja de departamentos, de 26 anos, que não quer se identificar, foi hospitalizada no domingo no Hospital Jardim América com falta de ar, febre e abcessos drenando secreção purulenta. Ao hospital ela teria informado que o instrutor da academia de ginástica que ela frequenta aplicou, há cerca de duas semanas, um produto que a vítima identificou como hormônio, para corrigir imperfeições dos glúteos.
O marido da mulher disse à reportagem que ela não quis dar mais detalhes sobre a aplicação, nem mesmo aos médicos. “Foi indicação de uma amiga que já tinha feito e conseguiu resultados. Ela me disse que foi um hormônio para emagrecer, para queima de gordura”, disse. Ele afirma que foi a primeira aplicação feita pela jovem, que apresentou rejeição à substância. “Ela passou muito mal, sentiu muita dor e falta de ar”, conta. A mulher está se recuperando e deve receber alta ainda hoje, disse o marido. A reportagem procurou o médico que está cuidando dela, mas ele alegou que, em função do sigilo profissional, não poderia dar informações.
A jovem chegou ao hospital com quadro de infecção e recebeu os primeiros atendimentos no pronto-socorro. Em seguida, foi encaminhada para internação na enfermaria, sem risco de morte. Segundo o marido, a substância aplicada, que ela identificou como hormônio, não tem a finalidade de aumentar a massa muscular, mas de provocar a queima de gordura. O produto, afirmou, pode ser injetado em qualquer parte do corpo, mas ele garantiu que não sabia seu nome ou marca.
A tentativa de driblar a genética, os efeitos da idade ou corrigir pequenas imperfeições podem levar as mulheres ou homens a graves consequências, caso o procedimento não seja feito por profissional habilitado, com substâncias de eficácia comprovada e efeitos colaterais testados. Em reportagem publicada no domingo pelo POPULAR, médicos ressaltaram os riscos da busca pela beleza a qualquer custo, que fez crescer de forma acelerada a oferta de serviços e produtos, nem sempre confiáveis, como alternativas não cirúrgicas para esculpir corpo e rosto.
Entre as substâncias proibidas, constam o lipostabil, enzima que já foi usada para queima de gordura, por meio de aplicações no corpo, e que foi proibida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Há ainda o caso do silicone líquido industrial, também vetado por causar processos inflamatórios e migrar para membros inferiores após sua aplicação.
Com a repercussão do caso de Maria José, que morreu após um procedimento de bioplastia nos glúteos, o Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgou em sua página uma nota de esclarecimento à sociedade, alertando sobre os riscos de procedimentos de preenchimento estético. No texto, o conselho reforça que a execução de procedimentos invasivos – sejam diagnósticos, terapêuticos ou estéticos – é atividade privativa do médico, conforme determinação da Lei do Ato Médico (12.842/13). O CFM pede às autoridades que “coíbam a atuação de indivíduos não médicos e à revelia da Lei nº 12.842/13, que com promessas de resultados mirabolantes interrompem vidas e deixam sequelas em homens e mulheres”.
A nota também pontua que o documento, que redefine as regras para fiscalização do exercício da medicina em território nacional, diferencia os consultórios e ambulatórios em quatro grupos, que vão desde os que oferecem serviços mais simples, até aqueles que realizam procedimentos mais complexos, com riscos de anafilaxias (reações alérgicas sistêmicas) ou paradas cardiorrespiratórias. Os casos de complicação registrados após preenchimento nos glúteos feitos por Raquel Policena, que se apresentava como biomédica, e suas parceiras de trabalho, já chegam a 24, segundo identificou a polícia. As mulheres se queixam de prejuízos estéticos e danos à saúde, inclusive risco de embolia.
Polícia procura mulher que se identificava com médica do Rio
A Polícia Civil de Goiás quer o depoimento de uma mulher que se identificava como médica do Rio de Janeiro para fazer aplicações de preenchimento nos glúteos em Goiânia e que teria relação com Raquel Policena Rosa, acusada de ter provocado a morte da auxiliar de leilões Maria José Medrado, no dia 25 de outubro. Thaís Maia Silva já foi reconhecida formalmente por clientes que fizeram o procedimento na capital nos últimos meses.
A mulher teria iniciado um esquema de bioplastia na capital goiana a partir de julho que logo se espalhou pelas redes sociais e no qual está envolvida Raquel. “Existe a possibilidade de, num primeiro momento, a Thaís ter ensinado a Raquel”, explicou a delegada Myriam Vidal, titular do 17º Distrito Policial (17º DP) e responsável pelo caso.
Além de Thaís e Raquel, também são investigados o professor de língua estrangeira Fábio Ribeiro, namorado de Raquel, e a fisioterapeuta Joice Flausino. “O namorado (de Raquel) ficava recebendo, passava cartão e a Joice sublocava o consultório”, disse Myriam Vidal.
De acordo com o depoimento de Joice à polícia, as sublocações aconteceram em dois finais de semana de julho e um de agosto. No segundo dia da aplicação ocorrida em agosto, a Vigilância Sanitária chegou ao Centro Terapêutico e Raquel e Fábio fugiram.
Segundo a delegada, depois de um tempo, houve um desentendimento entre Raquel e Thaís, que deixaram de atuar juntas. A suposta médica, então, convidou Joice e a fisioterapeuta, que trabalhava como atendente em uma clínica no Setor Bueno, passou a auxiliá-la. “Ela alugou uma sala da clínica por uma semana, a Thaís veio do Rio de Janeiro e as duas realizaram o procedimento”, relatou. De acordo com o depoimento de Joice à polícia, as sublocações aconteceram em dois finais de semana de julho e um de agosto. No segundo dia da aplicação ocorrida em agosto, a Vigilância Sanitária chegou ao Centro Terapêutico e Raquel e Fábio fugiram.
Em relação à sublocação do consultório no Setor Marista, a fisiterapeuta deverá responder por lesões sofridas pelas vítimas, caso sejam comprovadas. “Eu entendo que uma profissional da saúde, que está sabendo qual o procedimento realizado, ela assume o risco do que acontece alí. Ela tinha ciência, fazia propaganda, falava que era seguro”, disse a delegada. Como auxiliou Thaís na clínica do Setor Bueno, segundo a delegada, a fisioterapeuta também deverá responder por exercício ilegal da medicina.
Joice deixou a delegacia chorando e não quis falar com a imprensa. Mas em entrevista ao POPULAR, publicada na edição de terça-feira, ela já havia confirmado a sublocação à dupla: “Eu estava precisando de dinheiro para pagar o aluguel da clínica e uma esteticista me indicou a Raquel para alugar a sala. Disse que se tratava de uma pessoa especializada e usaria o consultório para fazer procedimento estético no bumbum”.
A própria fisioterapeuta se submeteu à bioplastia, feita por Thaís. “Eu também fui vítima nessa história”, alegou. No entanto, disse não ter tido nenhum problema com o resultado.
SEM REGISTRO
A polícia investiga se a mulher que se apresentava como Thaís era realmente médica no Rio de Janeiro. A delegada responsábel pelo caso disse que aguarda uma resposta do Conselho de Medicina do estado. Mas a reportagem fez uma consulta no site do Conselho Federal de Medicina (CFM) e não há nenhuma médica no país registrada com esse nome.
A assessoria de imprensa do Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego) esclarece que, mesmo se estivesse com situação legal no Rio de Janeiro, a suposta médica deveria ter procurado o Cremego para atuar no Estado, pois o registro é regional.
Fonte: Jornal O popular