Escrito por: Cristina Mesquita
“O procedimento foi realizado no Hospital Nasr Faiad, em Catalão e teve duração de aproximadamente de três horas”
Foi realizada no sábado, 29, a primeira cirurgia de captação de órgãos do interior de Goiás. O procedimento foi realizado no Hospital Nasr Faiad, em Catalão e demorou cerca de três horas, mobilizando a equipe da Central de Transplantes do Estado de Goiás que veio à cidade para captar os órgãos.
Todo o processo começou no dia anterior, quando foi detectada a morte cerebral do paciente, natural de Campo Alegre e que morreu, vítima de hipertensão intracraniana depois de sofrer um AVC, segundo o médico que estava de plantão na UTI do HNF, Petterson França. “Temos um protocolo a seguir. O primeiro, constatar a morte cerebral. Ela é confirmada por meio de dois exames feitos em intervalo de seis horas, sem interferência externa e realizados por dois médicos diferentes. Depois fazemos um exame por imagem para constatar a morte cerebral. Então, colhemos sangue para provas de compatibilidade e sorologias para que seus órgãos possam ser disponibilizados para o banco nacional de órgãos. Esses exames não são feitos em Catalão. Contamos com a ajuda primordial para o transporte do material que foi feito por um carro da prefeitura. Se não fosse a vontade e imediata presteza do senhor Idelvan (Idelvan Evangelista, do Departamento de Transportes do município), isso tudo poderia não ter acontecido, porque ele deixou ao nosso dispor, imediatamente, um veículo com motorista para levar o material para Goiânia”, disse o médico, contando que o paciente ficou internado na UTI do hospital por 10 dias pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
“Momento em que o Dr. Petterson França conversava com os familiares do seu Heleno Hilário, 56 anos de idade, que dou seus órgãos”
O segundo procedimento, segundo ele, é contar à família e abrir uma possibilidade para a doação dos órgãos possíveis. No caso do seo Heleno Hilário, 56 anos, todos os órgãos poderiam ser doados, porém, ele era portador da doença de Chagas, o que inviabiliza captação de alguns órgãos “por questões de falta de compatibilidade na fila de transplantes, haja visto que os receptores também teriam que ter doença de Chagas”, explicou o médico. No caso do seo Heleno, foram captados os rins e as duas córneas. “A emoção? O resultado, que é beneficiar quatro pessoas. São quatro pessoas que sairão da fila do transplante”, disse o médico, já emocionado, antes mesmo de iniciar a cirurgia de captação.
O médico, que veio de São Paulo para morar em Catalão e trabalhar no Nasr Faiad (ele é Cardiologista, com sub-especialização em imagem cardiovascular e trabalhou em Hospitais de renome na capital Paulista, dentre eles o Hospital Albert Einstein e Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo (onde teve a oportunidade de trabalhar com a equipe do doutor Ben-hur Ferraz Neto, o maior cirurgiões especialista em transplante hepático no mundo). Evidenciou ainda o trabalho da equipe e a estrutura tecnológica do hospital para a realização do procedimento, o primeiro no interior do Estado. Por volta das 15h30, a família do seo Heleno chegou de Campo Alegre para o último adeus ao irmão, que não era casado e não tinha filhos. A emoção tomou conta de todos, incluindo o sobrinho, Claudemar Alves Hilário, que falou com a imprensa e ressaltou o gesto da família em doar os órgãos do tio. “A gente resolveu doar, porque tem muitas pessoas precisando. Não é fácil para a gente, não é fácil falar. Mas a gente gostaria de incentivar as pessoas a doarem também porque a gente pode a vir precisar também. Então, a gente resolveu a doar para ajudar as pessoas”, disse ele, emocionado. “Meu tio cantava, compunha música, queria ser famoso e tal, então, por um lado é um jeito de ele ser famoso. A gente está levando um pouquinho do sonho dele para frente, que é ser uma pessoa famosa também. Tomara que essas pessoas que receberão esses órgãos façam bom uso deles”, ressaltou.
Claudeomar disse ainda da facilidade, que ele considerou o fato da cirurgia de captação ser realizada em Catalão, trazendo mais tranquilidade para a família. “É menos sofrimento, né. Imagina a gente ter que leva – lo para Goiânia, ficar esperando naquela angústia, então, Catalão tendo essa condição de fazer esse tipo de transplante (captação de órgãos) é um ganho grande para a região. A gente fica feliz de poder ajudar nesse ponto aí”.
“Foi tudo pelo SUS. Tivemos a atenção de todo mundo. O doutor (Petterson França) que cuidou de tudo recebeu a gente muito bem e parabéns a equipe da Casa aqui (Hospital Nasr Faiad). A gente fez (a opção de doar os órgãos) de coração, ninguém foi forçado a nada, a gente que quis doar mesmo para ajudar as pessoas mesmo”, concluiu o sobrinho.
“Nós não temos palavras para agradecer a família. Eu acho uma atitude altruísta da família e de um exemplo ímpar que tem que ser seguido. Essa família acaba de beneficiar quatro pessoas. Então, a gente só tem a agradecer”, falou o médico direcionando à família que aguardava próximo à UTI onde o seo Heleno estava internado. “O médico está bastante emocionado, primeiramente pela atitude da família, uma atitude comovente: na batalha perdida, você tem a vitória. Então, a primeira emoção é essa. A segunda é você poder beneficiar outras pessoas que é salvar. E eu transfiro parte da minha emoção, minha emoção toda para minha equipe. Sem a equipe, a gente não teria conseguido nada do que a gente conseguiu e sem a família”, disse bastante emocionado Petterson França.
Como foi o primeiro procedimento de captação de órgãos, realizado no interior do Estado, o médico acredita que outros tantos poderão ser feitos aqui, no Hospital Nasr Faiad. “A partir de agora, a gente conseguiu via Central de Transplantes e via Hospital Nasr Faiad, deixar bem claro que temos tanto recurso tecnológico quanto profissional para realizar outras captações. Que isso sirva de exemplo para que a gente consiga mais e mais beneficiar outras pessoas”.
A cirurgia correu dentro do esperado, disse especialista
Os médicos da Central de Transplante chegaram por volta das 15h45 no hospital. A equipe era composta por dois médicos especialistas, além de uma médica, do Hemocentro de Catalão, que fez a coleta das córneas. Ao final de todo procedimento, que durou pouco menos de três horas, as equipes, do Nasr Faiad e da Central de Transplantes, deixaram o Centro Cirúrgico com o sorriso estampado nos rostos. Foram captados as duas córneas e os dois rins do pacientes, que seguiram, primeiramente para Goiânia, transportados em caixas e especiais. “A cirurgia foi toda tranquila. Foi dentro do esperado. A gente fez a captação, agora temos que correr para o aeroporto, levar esses rins que eles precisam ser transplantados, mas foi tudo tranquilo, dentro do esperado”, disse o médico Bernardo Monteiro Antunes Barreiro, da equipe da Central de Transplantes do HGG. A equipe do Hospital Nasr Faiad também ganhou elogios do médico: “A equipe do hospital, a gente tem que agradecer. Estava todo mundo preparado, ajudou a gente bem. Foi muito tranquilo”, relatou, lembrando que um dos receptores dos rins é de Pernambuco. As córneas, a equipe ainda não sabia para onde iam ser transportadas.
“Eu acho que tem que gerar frutos. A gente precisa fazer isso mais, incentivar a doação de órgãos. A gente imagina que, talvez, fazendo esse tipo de ação, possamos incentivar mais as pessoas aqui do interior a tentarem a doar mais os órgãos. A gente precisa muito disso”.